Havaianas, a marca que mudou de dono após o escândalo da Lava Jato

Originalmente chinelos baratos usados por consumidores de baixa renda, as Havaianas foram elevadas ao patamar de grife mundial. Uma das maiores histórias de sucesso no Brasil ganhou uma nova etapa após os escândalos de corrupção envolvendo seus proprietários.

 

A Alpargatas, sua empresa matriz, era controlada desde 2015 pelo grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista.

 

Envolvidos em diversos escândalos de corrupção, os Batista confessaram seus crimes e aceitaram pagar uma multa recorde de 10,3 bilhões de reais ao longo de 25 anos para não ir parar na cadeia.

 

Tentando sobreviver ao escândalo, a J&F começou a vender seus ativos. Na semana passada transferiu por 3,5 bilhões de reais seu pacote de 54,24% de ações da Alpargatas a três holdings bancárias: Cambuhy Investimentos e Brasil Warrant, da família Moreira Salles, e Itaúsa, grupo que controla o Itaú, comandado pela família Setubal e Pedro Moreira Salles.

 

Nas ruas, pouca gente sabe sobre a mudança de mãos da icônica marca, lançada em 1962, inspirada nas sandálias japonesas de palha de arroz. Seu modelo de borracha emprestou o nome da capital do exotismo à época, o Havaí.

 

Hoje, clientes entram e saem das centenas de lojas oficiais no país, fascinados com o universo multicolorido: são até 150 modelos diferentes, que vão de sandálias básicas por cerca de 18 reais, a designs estilizados ou estampados por 35, e até incrustados de cristais Swarovski por mais de 200.

 

– A cara do Rio –

 

Em uma luminosa loja perto da praia de Copacabana, Solange Brascher, uma empresária de 55 anos, compra um par de Havaianas para sua filha. “No passado havia esse preconceito de que eram as sandálias das pessoas pobres, mas hoje são ‘cool’, atingem todas as classes”, conta.

 

No bairro mais turístico do Rio, praticamente não se vê outro calçado. É usada por moradores de rua, pelos trabalhadores que correm para pegar o ônibus, pelos turistas que chegam na praia.

 

Com mais de 200 milhões de pares vendidos por año, 16% no exterior, as Havaianas são um símbolo do Brasil junto com o futebol e o samba.

 

“Já comprei dez pares e quero comprar outros dez para meus amigos, porque na Europa são muito mais caras”, confessa Beatriz Rodrigues, uma turista portuguesa de 18 anos.

 

Havaianas começou a ser internacionalizar nos anos 90, com uma aposta forte no design e na publicidad. Do slogan inicial de “No deformam, não têm cheiro e não soltam as tiras” passou para o contundente “Todo mundo usa”.

 

Hoje o grupo Alpargatas tem mais de 700 pontos de venda em mais de cem países, entre eles Espanha, França, Estados Unidos, Argentina, China e Angola. Com o sucesso, vieram também as várias imitações.

 

As Havaianas “se tornaram um objeto de desejo. Hoje é um sinônimo do Brasil que deu certo”, explica à AFP Cláudio Goldberg, professor do MBA de Marketing da Fundação Getúlio Vargas.

 

– Da cesta básica à Madonna –

 

Antes de serem usadas por Madonna, David Beckham e Kim Kardashian e de a H. Stern personalizar uma versão em ouro por 18.000 dólares, as Havaianas eram sandálias usadas pelas camadas mais pobres da sociedade. Nos anos 80, o governo chegou a incluí-las na lista de produtos com preços controlados.

 

Criada pelas Alpargatas, fundada em 1907 pelo escocês Robert Fraser em São Paulo, a sandália tinha originalmente sola branca e tiras azuis.

 

Em 1969, um operário pintou por engano algumas tiras de verde e, surpreendentemente, a série foi um sucesso.

 

Foi assim que as Havaianas começaram a produzir tiras de outras cores e, a partir dos anos 90, modelos monocromáticos e uma ampla variedade estampas e acabamentos.

 

Seu sucesso foi avassalador. A marca estima que dois em cada três brasileiros compram em média um par de Havaianas por ano e calcula que com todas as sandálias vendidas se poderia dar 62 voltas na Terra.

 

Ainda é cedo para saber os impactos dessa mudança no controle da empresa. Pouco mudou quando a J&F comprou Alpargatas em circunstâncias ironicamente parecidas há dois anos do grupo Camargo Corrêa, que também optou pela venda depois de ser alvo da operação ‘Lava Jato’.

 

Os novos proprietários adiantaram que querem potencializar sua expansão nos EUA e que manterão, por enquanto, a atual direção.

 

“É bom que uma marca como essa continue sendo de um grupo de brasileiros. O perigo é que eles olhem o negócio meramente (de modo) financeiro e não mercadologicamente. Se eles não perderem a identidade e souberem manejar com efeito, eles vão ter o retorno”, acrescentou Goldberg.

 

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